Por: Almir e Gilberto Anjos
Na mesa, o vinho “Spice Route”, sul-africano, da uva “Syrah”, safra 2007. Um queijo gorgonzola saboroso ao som de “Emilie-Claire Barlow” pelo spotfy, clima descontraído e, ao mesmo tempo sagrado.
Vinho adquirido e guardado há mais de quatro anos, em tempos difíceis, aguardava em silêncio o momento propício para se apresentar a nós, nesse encontro único. Como de preparação despretensiosa para um ritual realizado em momentos especiais e de encontro. Encontro entre irmãos: de sangue e de gerações ancestrais em movimento do tempo.
Após aberto o vinho descansou por instantes atemporais, enquanto organizávamos a mesa, em simplicidade ímpar, mas repleta de expectativas, àquelas em que se esvazia a mente, aguardando o que o tesouro aberto, o vinho, vai nos trazer, surpreender e proporcionar.
Distribuído entre duas taças como de costume, enquanto conversávamos sobre coisas corriqueiras do cotidiano, coisas simples da vida, nossos hábitos, nossos anseios e crenças, o vinho vivo estava presente, aparecia entre nós, sem dizer palavra, só aromas, só desejos.
Pegamos as taças, brindamos e, moto-continuo, erguemos nossas mãos aproximando o nariz da borda rubi do vinho para a percepção dos aromas, nossa dimensão.
Habituados com o aroma frutado da uva neste contexto, percebemos na cor viva e exuberante, certa jovialidade distante.
A primeira surpresa: do rubi violáceo, encontramos uma cor tendendo ao vermelho atijolado, ainda no início, dizendo-nos, pela cor, que o vinho estava maduro e em seu auge de existência.
O glicerol presente e evidente escorrendo lentamente após a agitação das taças, dos seus quinze graus de teor alcoólico, também indicava essa maturidade e sua complexidade.
Então veio o aroma, escondido, quase recluso. Aos poucos mostrava-se como “estrebaria”, couro, algo animal talvez…
Um pouco fechado ainda, pedia mais tempo… como num percurso onírico em seu vai e vem…
Entramos mais a fundo. O cheiro discreto do couro velho do sofá da sala, quebradiço pelo tempo, a penumbra da noite clareada pela chama de poucas velas, misturado com o cheiro das compotas de frutas vermelhas, cozidas e esquecidas no tempo, durante anos, cozidas em fogo muito, muito baixo, sem ser sufocante, muito pelo contrário, ainda trazia o ambiente fresco e agradável da primavera, renovada.
Unia-se presente e passado em conjunto, no silêncio vívido do fogo, da chama que não se apaga.
E, ali, permanecemos em nossos pensamentos, degustando o vinho durante um bom tempo. Indefinido e infinito , parcela do tempo entre os dois mundos, vívidos em nós, vividos por nós, em momento único se consagração.
Que bela degustação, meu amigo! Momento ímpar!
Descrição poética. Parabéns!
Obrigado pelas palavras.
Grande abraço
Almir